É difícil falar sobre Fernanda, tantos e tais já foram e continuam a ser os elogios feitos a seu trabalho ao longo dos anos. Não tive a oportunidade de ver “A Moratória”, espetáculo que a revelou, graças à visão de Gianni Ratto e à generosidade de Maria Della Costa que, estrela de sua própria companhia, cedeu à opinião do diretor de que aquele papel principal não era para ela mas, sim, para a jovem integrante de seu elenco. Foi só depois, já no TBC,quando os primeiros conjuntos estelares  tinham saído para formar suas várias companhias, que os “novos” tiveram sua oportunidade no teatro de Franco Zampari, e foi como a D. Sereia de “Os Interesses Criados” que vi o primeiro trabalho destacado de Fernanda que, muito jovem, compunha com incrível brilho a velha cafetina.
Ainda hoje nós temos discussões sobre o espetáculo desses “Interesses Criados”,  dirigido por Alberto D’Aversa, pois eu, que apenas iniciava minha carreira de crítica, só vi o resultado satisfatório, enquanto ela, junto com Sergio, Natalia e Ítalo, tinha vivido um acidentado processo nos ensaios. Foi nessa noite,  depois do espetáculo, que conheci “os Fernandos” e seus futuros companheiros de Teatro dos 7.  Nos pouco mais de cinqüenta  anos que se passaram desde então, tive o privilégio de ir  conhecendo cada vez mais essa extraordinária mulher dentro e fora do palco, cujo trabalho nele e personalidade fora dele sempre me enriqueceram.

Já que estou escrevendo para a CAL, uma escola de teatro, gostaria  de falar um pouco, aos que se propõem exercer a profissão de intérprete na arte teatral,  sobre a dedicação e a disciplina que fizeram de Fernanda a atriz que ela é, sem ter a vantagem de uma escola, de um tempo para a formação. Não há dúvida de que, de saída, o grande, o imenso, talento que todos nós conhecemos e respeitamos ela já tinha; mas o que vocês, que têm uma escola e professores para orienta-los, talvez não conheçam é o esforço individual a humildade, a consciência de que talento é uma coisa que tem de ser trabalhada, aprimorada, para que fique devidamente a serviço do exercício desse ofício/arte que é a interpretação, em um aprendizado sem escola.  E não falo apenas do domínio da técnica da interpretação em si, mas da curiosidade e apreciação a respeito das outras artes, da implacável rotina de ficar em dia com a cidade, o país, e o mundo, a fim de formar o acervo do qual o intérprete se pode servir para entrar em harmonia com o universo do texto que vai interpretar.

Ninguém jamais viu Fernanda “tirar de letra” qualquer personagem, de qualquer gênero; sem ser levado a sério, sem ser devidamente preparado, nenhum trabalho pode alcançar o nível em que Fernanda exerce o seu ofício. E aquele ou aquela que tiver vontade de se dizer ator/atriz,  tem a necessidade e a obrigação de seguir o seu exemplo desse grande ícone do teatro brasileiro. O caminho de Fernanda é o único que conduz ao sucesso, à fama, dignas desses nomes,  a se  chegar a ser um verdadeiro intérprete, ou seja, a servir o teatro e seu público. Qualquer outra gratificação será ilusória.